sexta-feira, 1 de abril de 2016

NTN-B antecipa queda da inflação

Uma espécie de convergência entre o cenário traçado pelo Banco Central para a inflação e as expectativas do mercado financeiro parece começar a se desenhar. Enquanto o BC elevou para níveis considerados mais realistas sua projeção para o IPCA em 2016, a inflação implícita das NTN-Bs, títulos públicos atrelados ao IPCA, vem em trajetória firme de queda, o que aproximou as duas estimativas de forma não vista desde o começo do governo Dilma.
Analistas veem nesse movimento uma correção dos dois lados: enquanto o BC tem que assumir em suas projeções a deterioração das expectativas ocorrida no começo deste ano e as surpresas negativas com a inflação corrente em janeiro, o mercado assume que exagerou lá atrás. Ainda que não seja possível atribuir essa convergência à melhora da credibilidade da política monetária, esse movimento ajuda o Banco Central no esforço de retomar a confiança. "É muito cedo para falar em retomada de confiança, mas é um ponto positivo nessa direção", afirma o diretor de Tesouraria do Santander Luiz Masagão.
O BC elevou no Relatório de Inflação do primeiro trimestre a projeção para o IPCA em 2016 de 6,2% para 6,6%. Já a NTN-B com vencimento em janeiro de 2017 embutia uma inflação ao redor de 7%. Um trimestre atrás, essa taxa estava em 9,07%. No primeiro trimestre do ano passado, quando o BC estimava uma inflação de 4,9% para este ano, as NTN-Bs projetavam 6,87%. "Havia uma visão unânime no mercado de que a inflação superaria o teto da meta este ano, o que justificou uma disparada na inflação implícita das NTN-Bs", explica Masagão, do Santander. "Mas as coletas de preço vieram mais baixas, o dólar cedeu e o mercado começou a antecipar uma correção, que demora mais tempo a ser acompanhada por economistas."
Ele destaca que, enquanto a pesquisa Focus tende a ser mais "engessada", uma vez que a mudança de modelos de inflação depende de ajustes em diversas variáveis por tempo prolongado, investidores reagem mais rapidamente, tentando pegar o início do movimento. "A [inflação] implícita tende a andar na frente. Nossa expectativa é que a Focus acompanhe o movimento do mercado", diz.
A queda da inflação implícita vem ocorrendo desde meados de fevereiro, mas ganhou velocidade no começo de março. E a surpresa com o comportamento do câmbio teve influência direta. "O mercado esperava um dólar perto de R$ 4,40 e R$ 4,50 este ano, mas está vendo uma cotação ao redor de R$ 3,60", diz Ricardo Rossi, analista de renda fixa da Votorantim Corretora. "É uma queda importante, que coloca em dúvida a projeção de inflação dos analistas", afirma, lembrando que sua projeção ainda aponta para um IPCA ao redor de 7% no fim deste ano.
Rossi entende que essa mudança no câmbio reflete tanto a melhora das condições globais de liquidez como também das perspectivas para os fundamentos domésticos. "Claro que para ficar confiante em uma inflação dentro da meta é preciso que haja uma agenda de reformas. Mas já há razão para considerar que as [taxas de inflação] implícitas estavam exageradas", diz.
Para o sócio gestor da Modal Asset, Luiz Eduardo Portella, há uma questão técnica a ser considerada. Cresceu a demanda por juros prefixados, derrubando essas taxas - este ano, o contrato de DI de janeiro para 2017 cedeu 1,90 ponto percentual -, enquanto o juro da NTN-B não caiu na mesma intensidade, porque perdeu parte de seu apelo com a mudança no cenário de inflação. Como a inflação implícita é calculada a partir da diferença dessas duas taxas, ela diminuiu de forma expressiva.
Rossi, da Votorantim, destaca ainda como elemento importante nessa reavaliação do cenário de inflação a mudança de postura do BC. Em janeiro, uma reviravolta abrupta na comunicação da autoridade monetária afetou em cheio as expectativas. No primeiro dia da reunião de política monetária, usando como argumento um relatório negativo divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), Tombini, esvaziou as expectativas de aumento de juros. O receio de que a manobra tivesse caráter político levou os agentes a considerar um corte de juros no curto prazo e, assim, pioraram as projeções para o IPCA. No dia seguinte à decisão do Copom de manter a Selic, a inflação implícita da NTN-B para 2017 bateu a máxima de 9,6%.
Mas, em fevereiro, Tombini retomou um discurso mais cauteloso e afirmou que "não há espaço para flexibilização monetária", frase incorporada pelo Relatório de Inflação. "A mensagem de manutenção de juros, sem dúvida, ajudou nesse movimento de queda da implícita", afirma Rossi.
"Embora seja inegável que o cenário de inflação esteja melhorando, principalmente por causa do câmbio mais valorizado, vale a pena aguardar mais um pouco para mexer nos juros", afirma o economista-chefe da Garde Asset Management, Daniel Weeks. "Ele ainda tem uma briga a vencer com a Focus mas já está fazendo efeito sobre a implícita. Se ele cortar agora, pode atrapalhar esse processo."

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