Uma espécie de convergência entre o cenário traçado pelo Banco
Central para a inflação e as expectativas do mercado financeiro parece
começar a se desenhar. Enquanto o BC elevou para níveis considerados
mais realistas sua projeção para o IPCA em 2016, a inflação implícita
das NTN-Bs, títulos públicos atrelados ao IPCA, vem em trajetória firme
de queda, o que aproximou as duas estimativas de forma não vista desde o
começo do governo Dilma.
Analistas veem nesse movimento uma correção dos dois lados: enquanto o
BC tem que assumir em suas projeções a deterioração das expectativas
ocorrida no começo deste ano e as surpresas negativas com a inflação
corrente em janeiro, o mercado assume que exagerou lá atrás. Ainda que
não seja possível atribuir essa convergência à melhora da credibilidade
da política monetária, esse movimento ajuda o Banco Central no esforço
de retomar a confiança. "É muito cedo para falar em retomada de
confiança, mas é um ponto positivo nessa direção", afirma o diretor de
Tesouraria do Santander Luiz Masagão.
O BC elevou no Relatório de Inflação do primeiro trimestre a projeção
para o IPCA em 2016 de 6,2% para 6,6%. Já a NTN-B com vencimento em
janeiro de 2017 embutia uma inflação ao redor de 7%. Um trimestre atrás,
essa taxa estava em 9,07%. No primeiro trimestre do ano passado, quando
o BC estimava uma inflação de 4,9% para este ano, as NTN-Bs projetavam
6,87%. "Havia uma visão unânime no mercado de que a inflação superaria o
teto da meta este ano, o que justificou uma disparada na inflação
implícita das NTN-Bs", explica Masagão, do Santander. "Mas as coletas de
preço vieram mais baixas, o dólar cedeu e o mercado começou a antecipar
uma correção, que demora mais tempo a ser acompanhada por economistas."
Ele destaca que, enquanto a pesquisa Focus tende a ser mais
"engessada", uma vez que a mudança de modelos de inflação depende de
ajustes em diversas variáveis por tempo prolongado, investidores reagem
mais rapidamente, tentando pegar o início do movimento. "A [inflação]
implícita tende a andar na frente. Nossa expectativa é que a Focus
acompanhe o movimento do mercado", diz.
A queda da inflação implícita vem ocorrendo desde meados de
fevereiro, mas ganhou velocidade no começo de março. E a surpresa com o
comportamento do câmbio teve influência direta. "O mercado esperava um
dólar perto de R$ 4,40 e R$ 4,50 este ano, mas está vendo uma cotação ao
redor de R$ 3,60", diz Ricardo Rossi, analista de renda fixa da
Votorantim Corretora. "É uma queda importante, que coloca em dúvida a
projeção de inflação dos analistas", afirma, lembrando que sua projeção
ainda aponta para um IPCA ao redor de 7% no fim deste ano.
Rossi entende que essa mudança no câmbio reflete tanto a melhora das
condições globais de liquidez como também das perspectivas para os
fundamentos domésticos. "Claro que para ficar confiante em uma inflação
dentro da meta é preciso que haja uma agenda de reformas. Mas já há
razão para considerar que as [taxas de inflação] implícitas estavam
exageradas", diz.
Para o sócio gestor da Modal Asset, Luiz Eduardo Portella, há uma
questão técnica a ser considerada. Cresceu a demanda por juros
prefixados, derrubando essas taxas - este ano, o contrato de DI de
janeiro para 2017 cedeu 1,90 ponto percentual -, enquanto o juro da
NTN-B não caiu na mesma intensidade, porque perdeu parte de seu apelo
com a mudança no cenário de inflação. Como a inflação implícita é
calculada a partir da diferença dessas duas taxas, ela diminuiu de forma
expressiva.
Rossi, da Votorantim, destaca ainda como elemento importante nessa
reavaliação do cenário de inflação a mudança de postura do BC. Em
janeiro, uma reviravolta abrupta na comunicação da autoridade monetária
afetou em cheio as expectativas. No primeiro dia da reunião de política
monetária, usando como argumento um relatório negativo divulgado pelo
Fundo Monetário Internacional (FMI), Tombini, esvaziou as expectativas
de aumento de juros. O receio de que a manobra tivesse caráter político
levou os agentes a considerar um corte de juros no curto prazo e, assim,
pioraram as projeções para o IPCA. No dia seguinte à decisão do Copom
de manter a Selic, a inflação implícita da NTN-B para 2017 bateu a
máxima de 9,6%.
Mas, em fevereiro, Tombini retomou um discurso mais cauteloso e
afirmou que "não há espaço para flexibilização monetária", frase
incorporada pelo Relatório de Inflação. "A mensagem de manutenção de
juros, sem dúvida, ajudou nesse movimento de queda da implícita", afirma
Rossi.
"Embora seja inegável que o cenário de inflação esteja melhorando,
principalmente por causa do câmbio mais valorizado, vale a pena aguardar
mais um pouco para mexer nos juros", afirma o economista-chefe da Garde
Asset Management, Daniel Weeks. "Ele ainda tem uma briga a vencer com a
Focus mas já está fazendo efeito sobre a implícita. Se ele cortar
agora, pode atrapalhar esse processo."
Leia mais em : http://www.valor.com.br/financas/4506570/ntn-b-antecipa-queda-da-inflacao
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