O Panamá é um dos últimos "buracos negros" das finanças
internacionais e vai sofrer crescente pressão para acabar com a
opacidade das operações bancárias em seu mercado, que outros paraísos
fiscais já tiveram que abandonar.
É o que sinaliza o diretor de tributação da Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), Pascal Saint-Amans, em
entrevista ao Valor. Ele não se mostrou surpreso com a
dimensão do Panamá Papers, revelado pelo vazamento de 11,5 milhões de
e-mails, contratos e extratos de contas bancárias do escritório de
advocacia Mossack Fonseca.
Para Saint-Amans, o segredo bancário para encobrir evasão fiscal está
em regressão no mundo e o que resta acabou se concentrando no Panamá
nos últimos tempos, pela recusa desse país em aplicar os padrões
internacionais de transparência fiscal.
Em outros paraísos fiscais, a maioria dos clientes do setor
financeiro offshore (fortunas geridas fora do país de origem) aceitou
regularizar sua situação com o fisco. Quem não o fez escondeu a fortuna
com ajuda do Panamá.
Para ele, o sigilo financeiro a clientes que buscam esconder ativos é
mantido em boa parte pela forte pressão das firmas de advocacia sobre o
governo do Panamá.
O economista Gabriel Zucman, professor na Universidade da Califórnia e
autor do livro "The Hidden Wealth of Nations" (a riqueza oculta das
nações), que trata das atividades financeiras em paraísos fiscais,
calcula que 8% da fortuna financeira global de pessoas físicas estão em
paraísos fiscais.
Isso representa US$ 7,6 trilhões, depositados em centros offshore,
sendo um terço na Suíça, mas também em Hong Kong, Cingapura, Luxemburgo e
outros lugares.
Certos economistas calculam que os governos perdem US$ 200 bilhões
por ano em receita fiscal com a evasão de dinheiro que vai para os
centros offshore.
Saint-Amans reconhece que há muita batalha pela frente. Ele
exemplifica que somente as Ilhas Virgens Britânicas têm registradas 850
mil empresas de fachada, criadas para clientes por bancos e escritórios
de advocacia com o objetivo de dissimular o real beneficiário dos
ativos. No Panamá, a estimativa é que existem 100 mil dessas empresas da
fachada.
O que difere no caso do Panamá é que se trata do último centro
financeiro de certa importância que ainda utiliza ações ao portador,
consideradas a última capa de opacidade que, com os trustes, só existem
nesse país e na Suíça. Só que a Suíça também tende a desmontá-la,
enquanto o governo panamenho ignora as regras globais que vão entrar em
vigor em 2017.
A manutenção de uma total opacidade e recusa de cooperar só se
compara com Líbano, Bahrein e Vanuatu, que porém são centros financeiros
menos importantes.
Saint-Amans nota que esses paraísos fiscais escondem não só o
dinheiro da evasão fiscal, como servem também para lavagem de dinheiro
da corrupção, de cartéis da droga, de grupos terroristas etc.
Há dois meses, o Panamá foi removido da "watch list" do Grupo de Ação
Financeira Internacional (Gafi), entidade que estabelece padrões para
combater a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. Para
isso, contou com a ajuda essencial da França. Agora, o governo francês
foi o primeiro a pedir para o Panamá voltar a ser incluído na lista de
paraísos fiscais que precisam ser desmantelados.
Saint-Amans diz que, se não apareceram muitos americanos na lista da
Mossack Fonseca, é porque o Panamá tem um acordo com Washington e é
obrigado a dar todas as informações ao fisco.
Além disso, a OCDE comemora a decisão recente do governo de Barack
Obama de desmontar até o fim deste ano a estrutura de "single member LLC
(Limited Liability Company)", empresa de responsabilidade limitada
detida por uma só pessoa, normalmente estrangeiros. Estados americanos
considerados como paraíso fiscal, como Delaware, Wyoming e Nevada, podem
hoje dissimular a identidade do beneficiário real desde que ele não
tenham atividade nos EUA.
Segundo Saint-Amans, 96 países já aceitaram adotar a partir de
2017-18 a troca automática de informações. Por esse padrão, os governos
obterão dados de suas instituições financeiras e os trocarão com outros
países, para frear a evasão fiscal e ajudar a identificar quem esconde
dinheiro em paraísos fiscais. Ou seja, o Panamá não vai resistir muito
tempo.
Leia mais em: http://www.valor.com.br/internacional/4516178/panama-e-buraco-negro-financeiro-diz-especialista
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