Os dois mais renomados gestores de multimercados brasileiros, Verde e
SPX, reduziram de forma significativa a posição em dólar em relação ao
real nas últimas semanas. O Verde, que tinha 25% do patrimônio na moeda
americana no começo do ano e chegou a ter mais de 50% em 2015, acaba de
levar essa fatia a 20%. O
Valor apurou que também a
SPX, que chegou a dedicar 40% do risco do fundo às posições que ganhavam
com a alta do dólar, reduziu a cerca de 15%, e não opera mais contra o
real, somente nos negócios de dólar versus outras moedas.
As duas gestoras - Verde Asset com R$ 23,5 bilhões e SPX com R$ 8,5
bilhões em multimercados - carregavam desde 2013 posições expressivas na
moeda americana, fundamentadas em um pessimismo profundo sobre a
economia brasileira. A convicção rendeu altos ganhos. Foi a valorização
do dólar a principal fonte do retorno de 28,67% do Verde e de 31,5% do
Nimitz, da SPX, em 2015, ante 13,23% do Certificado de Depósito
Interfinanceiro (CDI), referência para aplicações conservadoras.
"Nossa postura de reduzir alocações foi no sentido de refletir e
reconhecer a mudança de cenário político", afirma Luiz Parreiras,
estrategista do fundo Verde. "Obviamente, a probabilidade de ter uma
mudança política aumentou consideravelmente. Até algumas semanas atrás,
trabalhávamos em um cenário-base de manutenção do governo, embora
reconhecêssemos a probabilidade de mudança. Agora, a probabilidade
cresceu a ponto de passar a ser o cenário-base", diz Parreiras, que é
braço direito do gestor Luis Stuhlberger. Era preciso reduzir as
posições, afirma, ainda que se saiba que o processo político vai ser
bastante complexo daqui em diante.
Também a SPX, segundo fontes, tomou a decisão de reduzir a posição em
dólar com base em uma perspectiva mais concreta de impeachment, que,
juntamente com os juros altos tornaram o custo de carregamento muito
alto. A taxa de juro é o custo de oportunidade do gestor. É preciso
acreditar que o dólar vai subir mais de 14,25% em um ano para fazer
sentido montar uma posição em dólar em vez de repousar em títulos
públicos.
Restam motivos, entretanto, para manter dólar no portfólio, na
opinião da equipe do Verde. Entre eles, está a expectativa de que o
Banco Central faça uma redução importante no estoque de swaps cambiais,
instrumento por meio do qual modera a desvalorização da moeda. "É uma
das principais razões pelas quais ainda temos conforto de manter a
posição comprada [apostando na alta]", diz Parreiras. "E, no médio
prazo, olhando os fundamentos, o real não é uma moeda barata, mesmo a R$
3,60". Ele destaca que a inflação tem corroído o valor do real e
considera que, em caso de uma recuperação da economia, o déficit em
conta corrente voltará a crescer.
No cenário internacional, Parreiras aponta que, além da postura mais
cautelosa do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), a
acomodação dos preços das commodities em níveis mais altos pesa contra
um real mais fraco. Para ele, entretanto, os vetores globais tendem a se
reverter ao longo do tempo, com os preços das commodities voltando a
desaquecer e os Estados Unidos prevalecendo como a economia mais
pujante.
Assim como na Verde Asset e na SPX, o dólar deixou de dar o tom em
grande parte dos multimercados macro, fundos que buscam ganhar com uma
tendência para os ativos e reúnem R$ 55,9 bilhões. George Wachsmann, que
seleciona gestores para clientes de alto patrimônio na GPS, conta que
muitas das casas que conseguiram surfar o cenário de deterioração
brasileira têm abandonado neste ano a posição de dólar contra o real.
Há, segundo Wachsmann, os gestores que simplesmente deixaram de
operar as duas moedas, mas também os que preferiram escolher entre uma
das duas. Os que acham que o jogo político vai culminar na troca de
governo posicionam-se em uma valorização do real contra a moeda de
outros emergentes. Os que acreditam na força da economia americana
preferem fugir das questões locais e se posicionar em dólar contra uma
cesta de moedas de emergentes que não inclua o real.
A Ibiuna Investimentos, que gere R$ 2,7 bilhões em multimercados,
está no grupo dos que reduziram a posição em dólar contra o real na
virada de fevereiro para março, segundo fontes, e zerou totalmente nas
últimas semanas, também com base na evolução dos eventos políticos.
Os multimercados macro da Mauá Capital, do ex-diretor de Política
Monetária do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo, também não têm
posições relevantes em dólar contra real há algum tempo. O retorno de
dois dígitos de janeiro a março foi obtido com posições em juros,
segundo o
Valor apurou.
Na gestora carioca Flag Asset Management, outro ex-BC, Sérgio
Goldenstein, cujo fundo acumula ganhos de 9,4% de janeiro a março com
juros, moedas e bolsa, chegou a montar uma posição pequena contra o
dólar, ou seja, para ganhar com a desvalorização da moeda americana. Já
no ano passado, o ex-chefe de Operações de Mercado Aberto do BC conta
ter começado a avaliar como um ajuste no balanço de pagamentos mudaria o
cenário para o real. "O câmbio estava muito apreciado nos anos
anteriores, mas chegou a um ponto em que começamos a avaliar que as
pressões seriam mitigadas", afirma.
Os desdobramentos da Lava-Jato e o crescimento da possibilidade de
impeachment foi a deixa, segundo o sócio-diretor da Flag, para se
posicionar contra o dólar. O fluxo cambial mais positivo para o real de
fato ocorreu e, em seguida, a gestora zerou a posição na moeda
americana. Caso o processo político siga no sentido da troca de governo,
até há espaço para uma maior apreciação do real, diz Goldenstein,
ressalvando que o BC dispõe de instrumentos para conter a velocidade do
movimento, o que aponta para posições em outros mercados, como em juros e
na bolsa brasileira.
Aumentar a posição em juros foi o caminho escolhido pela Verde Asset
em paralelo à redução do câmbio no portfólio. A gestora ampliou a
exposição em NTN-Bs, títulos públicos indexados à inflação. O
entendimento é que se desenha um cenário favorável a um novo movimento
do BC, com ajuda do real menos depreciado. "Achamos que a janela de
corte de juros se abre mais ainda", diz Parreiras.
Com a escolha de vencimentos entre cinco e seis anos, a Verde Asset
alongou um pouco o prazo de sua posição em renda fixa. Se o câmbio ficar
estável por volta de R$ 3,65, estima o estrategista da casa, o juro
real deve cair bastante, de 6,5% para algo mais perto de 5,5%,
principalmente em um contexto de mudança política.
Também os clientes de alto patrimônio da GPS têm visto a posição em
dólar cair, por meio dos multimercados em que aplicam, enquanto a renda
fixa atrelada à inflação cresce. "Achamos que é uma boa forma de
aproveitar os movimentos que têm acontecido de forma um pouco mais
protegida", diz Wachsmann.
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