A combinação entre juro alto, aumento do custo de carregamento da
dívida e deterioração dos fundamentos, com queda de receita e geração de
caixa, deve levar mais empresas a renegociações de dívida como a
anunciada pela Gol na noite de terça-feira para os US$ 800 milhões em
bônus no exterior. A próxima, e mais relevante, da fila é Oi, com US$ 8
bilhões só em títulos de dívida no exterior. A empresa de telefonia já
contratou uma assessoria para reestruturação de seu passivo e estuda um
plano para apresentar aos credores.
A dívida passível de sofrer algum corte ("haircut") atinge US$ 12
bilhões, cerca de 8% dos US$ 150 bilhões de estoque de bônus privados no
exterior, emitidos por empresas e bancos. Nesse grupo, estão desde
emissões que já sofreram algum default, entre elas Schahin, Odebrecht
Óleo e Gás, Cimento Tupi, Tonon Bioenergia, Grupo Virgolino de Oliveira
(GVO) e Aralco, até casos de empresas que estão ou têm alta
probabilidade de reestruturação, como as emissões de Gol e Oi, além de
USJ Açúcar e Álcool, que negocia troca de bônus.
Trata-se de um volume relevante, que ainda não pode ser considerado
"baixa", mas está em linha com a taxa de default para emissores
considerados de alto risco ("high yield") nos Estados Unidos em períodos
de estresse, pondera um executivo de banco de investimento que preferiu
não ser identificado. Em fevereiro, segundo monitoramento da Fitch
Ratings, a taxa de default de emissões high yield esperada para o setor
de energia dos EUA superava os 9%, puxado pelo segmento de exploração e
produção, com indicador acima de 14%.
Para se ter uma ideia, na América Latina, a taxa de default para
emissões corporativas de bônus com grau especulativo (o dado exclui
bancos e setores regulados, como o de concessões), segundo monitoramento
da Moody's, atingiu 4,9% em março, acima dos 4,6% da média global.
Entram na conta, além de falta de pagamento, renegociações forçadas de
dívida, ainda que em concordância dos credores, violação de cláusulas
("covenants") que gere vencimento antecipado, troca de dívida em
situação de estresse, processos de recuperação judicial.
Para os próximos 12 meses, afirma Cristiane Spercel, vice-presidente e
analista sênior da Moody's, a expectativa é que a taxa supere os 5%,
ainda como reflexo dos baixos preços de commodities como metais, minério
e petróleo e por conta de situações específicas. No caso do Brasil, de
empresas envolvidas na Operação Lava-Jato, além de Oi e Gol, em fase de
renegociação, e, no México, de construtoras que sofrem com o corte de
projetos públicos.
A Moody's não abre a taxa de default relativa ao mercado brasileiro,
mas, conforme Cristiane, do valor total de cerca de US$ 152 bilhões
relativo a 117 emissões high yield de América Latina com rating
acompanhadas pela agência, 73% referem-se a emissores com domicílio no
Brasil - só Petrobras concentra 34% da dívida classificada.
Contudo, um acompanhamento da Moody's sobre a liquidez das empresas
brasileiras não financeiras mostra que o risco de financiamento
aumentou, uma vez que a economia deve continuar enfraquecida. Segundo
Erick Rodrigues, vice-presidente e analista sênior da Moody's, o número
de companhias classificadas em situação de alto risco aumentou para 33%
no fim de 2015 ante 28% em 2014. Nesse grupo, estão companhias cujas
fontes de liquidez, como caixa e equivalentes, cobrem menos do que 150%
dos vencimentos de dívida nos próximos 12 meses.
"Ainda que as companhias venham trabalhando para reforçar a liquidez,
o caixa, a situação está cada vez mais difícil por conta da
deterioração dos fundamentos de setores especialmente expostos ao
mercado doméstico e de commodities, como óleo e gás e mineração, e do
aumento da aversão a risco tanto por parte de investidores como de
bancos".
Entre os setores em situação crítica, destaque para óleo e gás e
construção imobiliária. No grupo com risco médio de liquidez, metais e
mineração, transportes e telecomunicações. Na análise por empresa,
Petrobras, que só no exterior responde por um terço da dívida privada
brasileira (US$ 51,6 bilhões), e Oi concentram o maior risco, segundo a
Moody's. A agência cita que a empresa de telefonia só tem caixa para
honrar vencimentos e juros neste ano.
A Moody's destaca ainda o caso de Usiminas que enfrenta dificuldade
para gerar caixa de suas operações, o que deve manter suas métricas de
crédito pressionadas por um longo período e o risco de financiamento em
níveis altos se não houver uma reestruturação. Em março, a empresa
anunciou um acordo com seus principais credores (nove bancos no país e
no exterior) para a suspensão temporária de pagamento de dívidas pelo
prazo de 120 dias, condicionada à conclusão de uma capitalização de R$ 1
bilhão. Em bônus, a dívida é pouco relevante.
A própria CSN já esteve mais pressionada, por conta da alta
alavancagem, mas conseguiu alongar sua dívida bancária, dando fôlego
para 2016 e 2017.
Hoje, diz Rodrigues, diante da desaceleração econômica e do cenário
de incerteza política, o ambiente para as empresas buscarem
financiamento está muito mais seletivo e caro. O problema de rolagem,
afirma Hans Lin, responsável pela área de banco de investimentos do Bank
of America Merrill Lynch (BofA), varia conforme a companhia e o setor.
Empresas com caixa devem aproveitar para pré-pagar dívidas. "Com o
desconto grande dos bônus brasileiros no mercado secundário, a recompra
virou o melhor investimento", afirma. Marfrig, Raízen, Votorantim
Cimentos e Hypermarcas estão entre as empresas que anunciaram recompra.
Algumas companhias, continua Lin, vão buscar o alongamento e outras, de
fato, vão ter problemas para honrar os compromissos, tendo de partir
para a renegociação com credores.
Leia mais em: http://www.valor.com.br/financas/4549935/empresa-renegocia-bonus-externo
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