Depois de ter seu primeiro contato com educação financeira ao longo
de seis meses, 18 mil alunos do Ensino Fundamental brasileiro foram
testados pelo Banco Mundial. Nas 112 escolas municipais de Joinville
(SC) e Manaus (AM) onde foram submetidas ao programa piloto, a nota
média foi 515, ante 508 de um grupo que não recebeu a instrução - pela
metodologia, a mesma do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) que
considera o desempenho global do grupo, a régua vai de 370 a 793. Os
resultados, divulgados com exclusividade para o Valor,
serão apresentados hoje na Semana Nacional de Educação Financeira. Os
números vão servir de base à decisão de incluir ou não a educação
financeira no currículo das escolas públicas de Ensino Fundamental.
Os números não brilham aos olhos. Além do diferencial de somente sete
pontos de quem passou pelo programa, um olhar detalhado por pergunta
também mostra avanços sutis. Sem ter a educação financeira incluída no
cotidiano escolar, 16% dos alunos da nona série são totalmente contra
gastar o troco de uma compra com algo que querem no lugar de guardar o
dinheiro. Com a formação, o percentual sobe pouco, para 19%. O
percentual no mesmo grupo dos que acham que fazer alguma poupança é
importante para evitar problemas no futuro sobe de 37% para 38%. No
quinto ano, os que dizem ter aprendido a mexer com dinheiro na escola é
de 32% entre os que passaram pelo programa e de 27% entre os que não,
somente para citar alguns exemplos.
"Na verdade, o efeito não é muito grande, mas é estatisticamente
significativo, diferente de zero. Você pode dizer que funcionou", diz
Caio Piza, economista do Banco Mundial e um dos responsáveis pela
avaliação do projeto. Na análise dividida por séries, em que foram
testados os terceiro, quinto, sétimo e nono anos, os resultados foram
significativos do ponto de vista estatístico para os dois últimos, mas
não para os dois primeiros. "Precisamos compreender um pouco melhor como
incrementar o conhecimento e as atitudes dos alunos muito mais novos",
diz Piza.
De forma geral, o efeito mostrado foi semelhante ao de outras
intervenções na área de educação voltadas para a melhora de
proficiência, como em Matemática ou Português, quando sob avaliação,
segundo Piza. Ou seja, o diferencial pequeno das intervenções não é
exclusividade da educação financeira. Além disso, defende, a pesquisa
mostrou algum aumento de proficiência por conta da instrução, o que não
apareceu em estudos similares, como o de um programa com estudantes
entre 6 e 14 anos em Gana, na África, em que o incremento foi nulo. As
pesquisas para essa faixa etária são escassas.
O Banco Mundial já tinha aprovado o programa brasileiro voltado para o
Ensino Médio, ainda que também sem grandes margens. Os alunos que
receberam as aulas tiveram nota média de 60,4, ante 56,1 do grupo de
controle em um indicador de alfabetização financeira que ia de 0 a 100.
O resultado foi positivo principalmente quando se pondera que o
programa durou apenas seis meses, defende Claudia Forte, superintendente
da Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF-Brasil). Os livros
chegaram às escolas no meio de 2015, não no começo do ano escolar, e
ainda houve um intervalo até vencer a resistência dos 427 professores a
um novo material. O programa não cria uma disciplina específica, mas
indica o uso em meio a diferentes matérias. "É uma grande lição que o
programa deixa: precisamos sobretudo envolver o professor", diz Claudia,
que pensa em campanhas diretas e cursos de formação.
A partir do teste piloto, a ideia é disseminar o programa, segundo
Claudia. Não será, entretanto, uma missão fácil. No Brasil, enquanto o
Ensino Médio fica a cargo dos Estados, o Fundamental é tratado
principalmente no âmbito das secretarias municipais. São cerca de 130
mil escolas, que devem ser alcançadas por meio de conversas com mais de 5
mil secretários de Educação dos municípios. "Há de se fazer uma
articulação política extremamente importante", diz.
O Banco Mundial quer avaliar agora o resultado no Brasil de uma
exposição à educação financeira continuada, o que pode ser feito por
meio do acompanhamento de alunos da terceira série que acabaram de
entrar no programa.
A especialista em psicologia econômica Vera Rita de Mello Ferreira
defende que a educação financeira comece pelas crianças na escola. "É a
fase em que os comportamentos estão começando a se formar, então você
tem mais chance de instalar novos hábitos. É muito mais fácil do que
tentar mudar o comportamento de adulto", diz a professora, que integra o
comitê de pesquisa para educação financeira da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Para obter resultados nessa faixa etária, entretanto, o método
importa muito. Vera Rita, que prestou consultoria sobre aspectos
psicológicos na elaboração do material brasileiro, diz que está longe de
ser o caso de falar sobre investimentos para uma criança, mas sim de
ensinar a se organizar, planejar, lidar com recursos escassos. E ela
defende que os professores sejam muito bem capacitados.
Já William Eid, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da
Fundação Getulio Vargas (GVcef), diz que as pesquisas apontam para
resultados mais positivos da educação financeira "just in time", ou
seja, na véspera de ser colocada em prática. É por esse motivo que ele
defende formatos de intervenção como listas acessíveis on-line que
ofereçam o passo a passo para situações específicas, como trocar a casa
dos pais pelo imóvel próprio ou planejar um mochilão, por exemplo. "Essa
é a informação que importa, o restante ele não retém", defende o
professor.
Leia mais em: http://www.valor.com.br/financas/4567869/educacao-financeira-passa-em-teste-do-banco-mundial-mas-efeito-e-pequeno
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