terça-feira, 29 de dezembro de 2015

CVM terá mais rigor contra informação privilegiada

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) passará, nas investigações sobre possíveis negociações de investidores de posse de informação privilegiada, a instaurar inquéritos em vez de formular apenas termos de acusação. Na prática, a diferença é que o inquérito permite avaliações mais minuciosas, com tomada de depoimentos e produção de provas, que deverão também levar mais tempo de análise.

Segundo a CVM, esta é uma das medidas que estão sendo adotadas pela autarquia a partir de sugestões de um grupo interno que se dedica a pensar formas de aprimorar as investigações e reações da instituição à prática do chamado "insider trading" (negociação com informação privilegiada) no mercado brasileiro. Medidas estão em preparação e devem ser anunciadas em 2016. O que está por trás do trabalho é fazer com que a autarquia tenha "filtros adequados" para esses casos, para que não se perca tempo com acontecimentos que não merecem tanta atenção. O combate ao "insider trading" é um dos principais pontos do plano estratégico da CVM lançado em 2013 e que tem objetivos a serem perseguidos no prazo de dez anos.

Nos casos de "insider" levados a julgamento pelo colegiado da CVM, os advogados de defesa sempre questionam a qualidade dos termos de acusação. Queixam-se por vezes da falta da observação do padrão de negociação de acusados, e muitas vezes de pequenos valores negociados - sobre este aspecto, a CVM tem sido muito clara de que, independentemente de ganhos ou perdas, a autarquia está atenta à intenção de quem negociou as ações.

A questão é que a prova num caso de negociação com informação privilegiada é muito difícil de ser obtida. Dessa forma, as acusações são feitas com base em indícios, mas que precisam ser suficientemente fortes para apontar para a atuação irregular e configurar uma acusação. Além disso, o chamado "insider primário", cometido por pessoa que tem dever de sigilo perante a informação, gera um processo penal.

"Para acusar com base em indícios, você precisa demonstrar que eles são consistentes e fazem sentido. Sem inquérito, é possível que se comece a fazer suposições, a achar sem demonstrar nexo", avalia Luiz Leonardo Cantidiano, ex-presidente da CVM. Cantidiano esteve presente no último julgamento da autarquia de 2015, em que cinco acusados foram absolvidos da acusação de negociar com ações da Sanepar de posse de informação privilegiada.

A base da acusação era a tese de que as pessoas e gestoras envolvidas se conheciam e que a suposta informação privilegiada teria circulado entre todas. Ao final, o colegiado da CVM avaliou que a acusação não conseguiu comprovar nem o acesso à informação não divulgada ao mercado, nem o fato de ela ter circulado entre os acusados.

Cantidiano atuou na defesa de um dos acusados e, ao se manifestar no julgamento, se disse preocupado com acusações da CVM "com base em suposições".

"Me preocupa acusação com base em suposições, tais como fulano conheceu sicrano em tal lugar e provavelmente tinha conhecimento da informação sem avaliar se a informação era relevante e impactaria volume e preço, transferindo para os acusados o ônus difícil de tentar demonstrar que não houve insider, quando na verdade caberia à autarquia apresentar prova concreta do ilícito. Acusação de insider deveria ser objeto de processo com inquérito e análise de prova, para que possa se basear em termos concretos e não em ilações e coincidências", afirmou.

Também atuando na defesa de um acusado no caso Sanepar, Luiz Antonio de Sampaio Campos, sócio do escritório Barbosa Müssnich Aragão (BMA), "acompanhou integralmente" a manifestação de Cantidiano. "O processo de insider tem consequências muito graves, uma vez que a prática pode ser considerada crime. O acusador deveria tomar redobrado cuidado na instrução probatória. No processo de insider, é permitida a prova indiciária, mas ela não pode ser muleta", afirmou Campos.

Na ocasião, o advogado avaliou que a acusação da CVM havia se utilizado "do que pensou ser indícios" para acusar sem realizar investigação adequada. O advogado queixou-se ainda que, se tivesse praticado a negociação com informação privilegiada, seu cliente seria um insider secundário, aquele que não tem dever de sigilo perante a informação e que não pode ser punido por lei. Mas, mesmo assim, a CVM fez uma comunicação sobre o caso ao Ministério Público.

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