sexta-feira, 21 de julho de 2017

Análise de Impacto Regulatório no Brasil – Um exemplo a ser seguido

Em que pese a evolução do uso da Análise de Impacto Regulatório (AIR) em escala mundial, o que melhora substancialmente a qualidade dos atos normativos das políticas públicas, de regulamentação ou de regulação, a partir das experiências norte americanas no início dos anos 80, o Brasil se encontra em estágio bastante atrasado no uso desse instrumento, num gap de várias décadas.

São notáveis as experiências relatadas e acumuladas dos organismos centralizados, tanto do Office of Information and Regulatory Affairs (OIRA) do Governo dos EUA, como o Impact Assesment Board (IAB) da Comissão Europeia, no uso e na melhoria contínua e nos ganhos da metodologia de aplicação da AIR. Outras podem ser creditadas à Organization for Economic Co-operation and Development (OCDE), envolvendo os seus 35 membros efetivos, dentre os países europeus, americanos, asiáticos e outros.

A AIR é definida como uma ferramenta usada para analisar os prováveis efeitos de novas normas ou de alteração de políticas existentes. Envolve uma análise detalhada para antecipar se a nova política, regulamentação ou regulação poderá ou não atingir os fins desejados. Ajuda a identificar os efeitos colaterais ou custos ocultos associados com a regulação pretendida e a quantificar os custos prováveis de cumprimento por parte dos cidadãos e empresas. Ajuda também a definir o custo do enforcement do Estado.

Além disso, uma adequada AIR tem a capacidade de produzir melhores resultados na identificação clara das opções para atender o objetivo desejado das políticas públicas (incluindo a opção de não regular), no fortalecimento da discussão das propostas com informações sobre o impacto das análises regulatórias, facilitando em muito o debate, e no envolvimento dos afetados pelos atos normativos, que podem avaliar e criticar suas eficácias.

Como princípio básico, as decisões sobre os atos normativos de definição das políticas públicas devem ser tomadas de modo muito transparente – isto é, os dados e os motivos pelos quais as decisões são tomadas devem ser públicos e com ampla consulta aos envolvidos, principalmente aos afetados e isto faz parte da AIR. Não é incomum, entre nós, que a aplicação de leis aprovadas no Congresso Nacional, vez por outra, vejam-se em situações de incumprimento por dificuldades operacionais, exigindo reposicionamento dos seus promotores com relação à revisão ou à edição de novos atos normativos. Isto poderia ser evitado com uma adequada AIR que antecipa ou simula a aplicação dos impactos e se antecipa aos resultados.

Por outro lado, a judicialização de um setor, de algum modo, está associada à qualidade dos atos normativos, uma vez que, por não serem discutidos amplamente com os envolvidos cria-se expectativas infundadas, levando a questionamentos administrativos e, de modo indesejável, jurídicos, nas instâncias superiores. No caso particular do setor elétrico, extremamente complexo, a judicialização pode provocar um desequilíbrio na sustentabilidade dos negócios. Segundo Scott Jacobs, como resultado das AIRs da Environment Protection Agency, dos EUA, chegou-se à conclusão de que U$1,00 gasto com AIR pode reduzir o custo da regulação em cerca de US$1.000,00.

Numa visão geral de como são preparados os atos normativos no Brasil, os projetos de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo e os Decretos Presidenciais são elaborados com base no Decreto no. 4.176/2002, caracterizando que a Administração Direta não faz qualquer consideração sobre a análise de impacto correspondente aos Projetos de Lei que são preparados. Apenas no caso da Administração Indireta, ou de Órgãos de Estado como a ANEEL e algumas outras agências reguladoras, tem-se incorporado a AIR nos seus processos de produção normativa e regulatória. Poucas agências tratam o tema como sistemático e obrigatório para a edição de atos normativos. Ressalte-se, contudo, que não há razão alguma que explique o porquê do uso da AIR apenas nos atos produzidos pelo Poder Executivo ou nos Órgãos de Estado.

Mais grave ainda é que a discussão sobre a adoção da AIR na produção de atos normativos no Poder Legislativo tem sido totalmente negligenciada. Salvo a realização de projetos-piloto de AIR na Câmara e no Senado, tanto Câmara como Senado, Presidência da República, Ministérios, Autarquias Comuns, Autarquias em Regime Especial e quaisquer outros órgãos que venham a produzir atos normativo das políticas públicas devem analisar ex-ante e ex-post os impactos de suas proposições normativas.

Tal como indicado anteriormente, o destaque da experiência da implantação da AIR no Brasil vai para a experiência acumulada da ANEEL, no âmbito da Administração Indireta como Órgão de Estado, a partir dos esforços realizados de divulgação e promoção do seu uso no âmbito do Programa de Fortalecimento da Capacidade Institucional para Gestão em Regulação (PRO-REG), criado pelo Decreto no. 6.062 de 16 de março de 2007.

Considerando os resultados das 47 AIRs, elaborados pela ANEEL no período de 2013 a 2015, constata-se que embora haja espaço para melhoria no acervo daquela casa, a qualidade das análises tem melhorado significativamente desde a sua implementação. Uma análise comparativa de tais AIRs da ANEEL, à luz da experiência do OIRA norte-americano, mostra que a ANEEL conta com bons exemplos, embora existam carências específicas na metodologia aplicada, relacionadas com a linha de base, seleção e avaliação de alternativas, análise quantitativa e apresentação de dados e resultados para o público em geral e não somente para os envolvidos mais qualificados, e que podem ser aperfeiçoadas.

Aqui cabe uma observação para todo o setor elétrico, aplicável também aos demais setores: não basta apenas a ANEEL fazer as AIR de todos os seus atos, dado que são vários os agentes normativos da administração que estabelecem regras, como o Ministério de Minas e Energia (MME), o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) e a Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais (CPAMP) do MME. Pelo exposto, todos eles devem igualmente utilizar a AIR para dar unidade de tratamento, maior transparência, eficiência, consistência e qualidade nos resultados em todo o setor.

Assim, é imperativo que se institucionalize, o mais rápido possível, na Administração Pública Brasileira, de modo amplo e abrangente, o uso da AIR, sob pena de continuarmos atrasados na produção de políticas públicas mais eficazes, fundamentais para o desenvolvimento sustentável do País. A experiência da agência reguladora ANEEL é um exemplo a ser seguido e aperfeiçoado, com base nas melhores práticas internacionais aplicáveis.

Ricardo Pinto Pinheiro é consultor em Políticas Públicas, Regulação e Serviços Públicos de Energia, Transporte por Rodovias e Saneamento Básico. Ele foi Presidente da Eletronorte, Secretário de Energia, Diretor-Presidente do DNAEE e DNC, Diretor da ANP, Especialista em Energia do BID em Washington – DC, Diretor Presidente da ADASA e Presidente das Associações ABAR e ABCR.

Leia mais em: http://www.abradee.com.br/imprensa/noticias/3516-analise-de-impacto-regulatorio-no-brasil-um-exemplo-a-ser-seguido-canal-energia-artigo

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